terça-feira, 31 de outubro de 2017

Morrer lentamente.


Morre lentamente quem não sorri para uma nova manhã, quem esqueceu de olhar as estrelas na noite anterior e quem não se encanta com a grandiosidade da natureza à sua volta.
Morre lentamente quem não encontra graça em si mesmo, quem destrói o seu amor-próprio, quem não se deixa ajudar.
Morre lentamente quem se transforma em escravo do hábito, repetindo todos os dias os mesmos trajetos, quem não muda de marca, não se arrisca a vestir uma nova cor, ou não conversa com quem não conhece.
Morre lentamente quem faz da televisão seu guru, ou sua única companhia.
Morre lentamente quem não toma iniciativa alguma quando está infeliz com seu trabalho, quem não arrisca nem um pouco que seja, para ir atrás de um sonho.
Morre lentamente quem passa os dias se queixando de sua má sorte ou da chuva incessante ou do sol intenso.
Morre lentamente quem abandona um projeto antes de iniciá-lo, quem não pergunta sobre um assunto que desconhece, ou não responde quando lhe indagam sobre algo que sabe.
Morre lentamente quem não mais agradece a Deus pelos filhos que lhe deu, ou pelos pais que o receberam neste mundo.
Morre lentamente quem não retribui o sorriso de um bebezinho, e quem não acha fascinante a forma pela qual chegamos todos a este mundo.
Morre lentamente quem não abraça, quem não beija, quem não expressa carinho de alguma forma – mesmo que através de um olhar.
Morre lentamente quem é adepto de expressões como este mundo não tem jeito mesmo, ou a coisa está cada dia pior.
Morre lentamente quem se desespera com a perda de um amor, e não consegue perceber que há muitos que podem ser amados por nós, e muitos que podem nos amar profundamente.
Morre, sem perceber, dia após dia, quem não se dedica à felicidade de alguém, quem não se doa, quem não divide o que tem - material e espiritualmente – com outras pessoas.
*   *   *
Evitemos a morte em doses suaves, recordando sempre que estar vivo exige um esforço muito maior que o simples fato de respirar.
Estar vivo pressupõe agir, e não apenas reagir. Toda reação é perigosa, pois comumente não passa pelo processamento seguro da razão.
Estar vivo implica em fazer avaliações constantes, não avaliações dos outros, mas de nós mesmos e de nosso viver.
Quem não se avalia perde grandes chances de se aprimorar, de poder mudar de rumo quando percebe que a direção poderia ser outra.
Estar vivo significa: entusiasmo - carregar Deus em nossa alma, levar a certeza de Sua presença em nossas vidas e a vontade de conquistar os altos páramos da felicidade.
*   *   *
Vivo para que o sol tenha sentido, e é minha luminescência que ele espelha e devolve ao orbe, agradecido.
Vivo para que a chuva lave o ar, e leve volte ao éter com meu perfume elegante, de árvore vigorosa de seiva sã.
Vivo para que o amor tenha vazão, e não deseje razão – pois de condição o amar não precisa.
Vivo para florescer outros jardins, e sem perceber o meu se abarrota de lírios, ciclames, girassóis...
Vivo cada dia como se fosse cada dia. Nem o último nem o primeiro - o único.
Redação do Momento Espírita, com base no
texto Quem morre, de Martha Medeiros.

terça-feira, 24 de outubro de 2017

Saindo do poço.


Narra uma lenda chinesa que no fundo de um poço pequeno, mas muito fundo, vivia um sapo.

O que ele sabia do mundo era o poço e o pedaço de céu que conseguia ver pela abertura, bem no alto.
Certo dia, um outro sapo se abeirou da boca do poço.
Por que não desce e vem brincar comigo? É divertido aqui. - Convidou o sapo lá embaixo.
O que tem aí? – Perguntou o de cima.
Tudo: água, correntes subterrâneas, estrelas, a luz e até objetos voadores que vêm do céu.
O sapo da terra suspirou.
Amigo, você não sabe nada. Você não tem ideia do que é o mundo.
O sapo do poço não gostou daquela observação.
Quer dizer que existe um mundo maior do que o meu? Aqui vemos, sentimos e temos tudo o que existe no mundo.
Aí é que você se engana, falou o outro. Você só está vendo o mundo a partir da abertura do poço.   
O mundo aqui fora é enorme.
O sapo do poço ficou muito chateado e foi perguntar a seu pai se aquilo tudo era verdade.
Haveria um mundo maior lá em cima?
O pai confirmou: Sim, havia um outro mundo, com muito mais estrelas do que se podia ver dali debaixo.
Por que nunca me disse? – Perguntou o sapinho, desapontado.
Para quê? O seu destino é aqui embaixo, neste poço. Não há como sair.
Eu posso! Eu consigo sair! – Falou o sapinho.
E pulou, saltou, se esforçou. O poço era muito fundo, a terra longe demais e ele foi se cansando.
Não adianta, filho. – Tornou o pai a dizer. Eu tentei a vida toda. Seus avós fizeram o mesmo. Esqueça o mundo lá em cima. Contente-se com o que tem ou vai viver sempre infeliz.
Quero sair! Quero ver o mundo lá fora! – Chorava o filhote.
E passou o resto da vida tentando escapar do poço escuro e frio. O grande mundo lá em cima era o seu sonho.
                                                                      * * *
Um pobre camponês de apenas oito anos de idade não se cansava de ouvir esta lenda dos lábios de seu pai.
Vivendo a época da revolução cultural na China de Mao Tsé Tung, o menino passava fome, frio e toda sorte de privações.
Pai, estamos em um poço? – Perguntava.
Depende do ponto de vista. – Respondia o pai.
Mais de uma vez o garoto se sentia como o sapo no poço, sem saída.
Mas ele enviava mensagens aos Espíritos. Pedia vida longa e felicidade para sua mãe.
Pedia pela saúde de seu pai mas, mais que tudo, ele pedia para sair do poço escuro e profundo.
Ele sonhava com coisas lindas que não possuía. Pedia comida para sua família.
Pedia que o tirassem do poço para que ele pudesse ajudar seus pais e irmãos.
Ele pedia, e sonhava, e deixava sua imaginação o levar para bem longe.
Um dia, a possibilidade mais remota mudou de modo total o curso da sua vida. Ele foi escolhido entre centenas de camponeses e foi fazer parte de algumas das maiores companhias de balé do mundo.
Um dia, ele se tornaria amigo do presidente e da primeira-dama, de astros do cinema e das pessoas mais influentes dos Estados Unidos.
Seria uma estrela: o último bailarino de Mao Tsé Tung.
Li Cunxin saiu do poço.
                                                                       * * *
Nunca deixe de sonhar! Nunca abandone seus ideais. Mantenha aquecido o seu coração e viva as suas esperanças.
O amanhã é sempre um dia a ser conquistado! Pense nisso!
Redação do Momento Espírita com base no cap. 3,
do livro Adeus, China – O último bailarino de Mao,
de Li Cunxin

terça-feira, 17 de outubro de 2017

Tuas mãos cabiam dentro das minhas.



Quando tuas mãos ainda cabiam dentro das minhas e num abraço eu te fazia como que desaparecer, a ventania passava veloz e enfurecida, e feito árvore de raiz profunda, nada nos fazia mover.
Quando teus sonhos ainda cabiam dentro dos meus e uma dúzia e meia eram os habitantes da Terra, nem um dia sequer de sorriso se perdeu e de meu rosto sempre tiveste a expressão mais sincera.
Quando teus deuses do Olimpo eram apenas doissocorrendo-te e atendendo-te na velocidade do pensar, percebi que servir me fez feliz, pois a entrega me deu sentido. Viver é se entregar.
Quando tua mente ainda era casa de brinquedoque eu conhecia cômodo a cômodo, do teto ao chão;
quando ainda tua morada não possuía sequer um segredoe o teu respirar, no colo, era letra da minha canção;
quando tua voz no mundo ainda era a minhaeu me desafiava tentando te entender.
Perdi-me de mim e encontrei a linha; teci no teu linho e aceitei te ensinar a tecer.
Quando teu ir e vir dependia do meu e ainda te levava para onde meu coração queria, já aceitava o futuro meu, o futuro teu, o dia em que esse meu amor, sem pesar, te libertaria.
*   *   *
Estudos mostram que até em torno dos seis meses, os bebês se percebem como extensão das mães, isto é, não se veem ainda como um outro ser.
As mães, por sua vez, pela intensa ligação que têm com os filhos, desde a vida intra-uterina, acabam tendo a impressão de que os filhos são como que partes de si mesmas.
Os filhos crescem. Enxergam-se como individualidades. Pensam por si só. Têm vontade própria e tornam-se independentes em quase tudo.
Por outro lado, muitos corações de mãe e de pai ainda permanecem com aquela impressão singela de que continuam sendo seus bebês. Como se uma parte de seu amor tivesse ficado mergulhado no passado...
Tornam-se nostálgicos, voltam a olhar os álbuns de fotografias para tentar entender quando foi que cresceram, quando foi que mudaram tanto e não conseguem encontrar...
Tudo isso é saudável quando serve para reforçar os laços, quando torna os vínculos cada vez mais fortes e perenes, impossíveis de serem afetados por qualquer dificuldade encontrada pelo caminho.
Os pais devem apenas ter atenção quando esses sentimentos descambam para as esferas da superproteção, do excessivo cuidado que sempre trazem prejuízo para todos na família.
Há o tempo de carregar no colo, de atender as vontades, de seguir as escolhas dos pais.
Depois há o tempo de caminhar ao lado, atender uma ou outra vontade e lhes dar a chance de fazer algumas escolhas.
E, por fim, o tempo de observar sua nova caminhada à distância, de permitir que eles mesmos satisfaçam suas vontades, aceitando as consequências de todas suas decisões e escolhas.
Não se trata de um abandono, mas é o momento em que os pais deixam de serservos – e não há nada depreciativo nesta palavra – e passam a ser anjos de guarda.
Os anjos guardiões estão sempre presentes, atuam prontamente em toda necessidade, porém, não interferem no livre-arbítrio das criaturas. Aconselham, advertem, consolam. A decisão final é sempre do protegido.   
Redação do Momento Espírita, com base no

poema Tuas mãos cabiam dentro das minhas,
de Andrey Cechelero.

terça-feira, 10 de outubro de 2017

As Estações em nós.

Quando chega a primavera, ela se veste de flores, cores e perfumes.
O clima se faz propício para a reprodução das plantas.
Os animais comemoram brincando e trazendo mais vida e alegria.
As temperaturas vão aumentando gradualmente, as águas dos rios e do mar se aquecem.
A poesia nessa estação é inspirada pela variedade de cores que apresenta.
As pessoas ganham novas energias e se entusiasmam a cultivar seus jardins, hortas e pomares.
Tudo transpira liberdade e vida, amor e alegria, risos e brincadeiras.
O sol brilha aquecendo, e as plantas renascendo, se espreguiçam vaidosas.
É depois de um intenso período cinza e frio, que ela chega, intermediando o próximo verão.
Fica muito claro, nesse período, o ciclo das estações do ano: a primavera gargalhando vida, o verão trazendo o auge do seu esplendor, o outono permitindo a colheita dos frutos e o inverno se vestindo de neve e frio, declinando do ciclo mágico.
                                                                      *   *   *
Assim como as estações se sucedem, em nossa vida também passamos por ciclos.
Podemos comparar a primavera com nosso renascimento, no planeta, com a infância despreocupada e a juventude plena de energia.
A maturidade pode ser comparada ao esplendor do verão, que se apresenta como a força da natureza em cada ser.
O outono significa aquele período especial das realidades particulares, na colheita dos plantios realizados. Também período em que podem ocorrer perdas significativas.
São os amores que partem, a pouco e pouco, amizades que demandam o grande lar.
E o inverno seria o decrescer das forças físicas, que desaceleram gradativamente.
Tempo de recolhimento e de meditação, tempo de analisar os anos transcorridos e formular planos para um novo período.
Importante que saibamos aproveitar cada ciclo, que entendamos a importância de cada estação, que tenhamos a sabedoria de usufruir, em totalidade, cada momento, como único e irrecuperável.
Em síntese: viver em totalidade.
                                                                        *   *   *
Necessário tratarmo-nos como um templo divino que merece respeito, carinho, perdão e amor.
Autoconhecimento é a primavera florida e rica de recados para um futuro promissor.
Autotransformação é o rigor do verão dos aprendizados que temperam e equilibram, seguidos pela ruptura do outono, que recicla, por meio das perdas necessárias e inadiáveis.
Auto amor é o inverno, a busca permanente da alma em se recolher e se aquecer com o próprio calor, com os próprios recursos.
Somos nós com nós mesmos, nos destinos da vida.
Os ciclos da vida somente fluem quando celebramos a nossa história pessoal.
Não sejamos cópia de ninguém.
Cada um de nós nasce para florir e embelezar a vida de um modo único.
Meditemos a respeito. Saibamos florescer, dar frutos, nos permitir o colorir das nuances outonais, até alcançar a neve dos dias de inverno.
Vivamos cada estação com alegria, descobrindo-lhe a beleza, a ousadia, a oportunidade.
Não lamentemos os dias idos, nem choremos o ontem. A melhor estação é a que estamos vivendo.

quarta-feira, 4 de outubro de 2017

Dias perfeitos.

Dias perfeitos são esses em que a meteorologia afirma “vai chover” e chove mesmo: não os outros, quando se anda de capa e guarda-chuva para cá e para lá, até se perder um dos dois ou os dois juntos.
Dias perfeitos são esses em que todos os relógios amanhecem certos: o do pulso, o da cozinha, o da igreja, excetuando-se apenas os das relojoarias, pois a graça desses é marcarem todos horas diferentes.
Dias perfeitos são esses em que os pneus não amanhecem vazios; as ruas acordam com dois ou três buracos consertados, pelo menos; os ônibus não vêm por cima de nós, buzinando e na contramão; e os sinais de cruzamento não estão enguiçados...
Dias perfeitos são esses em que ninguém pisa nos nossos sapatos, nem esbarra com uma cesta em nossas meias, ou, se isso acontecer, pede milhões de desculpas, hábito que se vai perdendo com uma velocidade imensa.
Dias perfeitos, esses em que voltamos para casa e a encontramos intacta, no mesmo lugar.
E intactos estão nossos tristes ossos, e podemos dormir em paz, tranquilos e felizes como se voltássemos apenas de um pequeno passeio pelos anéis de Saturno.
*   *   *
A crônica de Cecília Meirelles fala desse nosso desejo de que tudo esteja sempre no seu devido lugar.
Somos seres de expectativas. Esperamos da vida, dos outros, das coisas, de tudo. E cada vez que algo não corresponde a um desses nossos aguardamentos, emburramos, à maneira das crianças mimadas.
Frustração, decepção, desilusão. Quanto demonstramos esses sentimentos...
Desejamos ter tudo sob controle, sob nosso controle.
Porém, imaginemos cada ser no planeta querendo o mesmo: será que essa equação fecharia?
Da mesma forma, o que é perfeito para nós pode não ser para o outro. Como resolveríamos esse impasse? Quem teria prioridade num Universo justo?
Não criemos expectativas em demasia. Deixemos a vida nos surpreender. Esperemos de tudo e não esperemos nada.
As pessoas não pensam como nós e o Universo não está à nossa mercê para ficar simplesmente satisfazendo nossos caprichos aqui e ali.
A beleza da vida está, muitas vezes, exatamente nisso que podemos chamar de imperfeições. A poetisa a enxergou nos relógios marcando horas diferentes na relojoaria.
Alguém mais prático poderia perguntar: Mas de que servem esses relógios se não marcam a hora certa?
O poeta responderia: Que tal se perder na hora, no tempo, de vez em quando, sem saber qual relógio está certo, qual relógio está errado? Afinal, que é o tempo?
A beleza da vida está em enxergar perfeição nos dias, mesmo que não tenham sido nada do que esperávamos deles. Está em terminar cada jornada, entre o amanhecer e entardecer, um pouco mais maduros, mais conscientes, mais perfeitos, pois é a nossa própria perfeição que devemos buscar.
Veremos que, conforme vamos nos tornando mais perfeitos, os dias também o serão, independente de como se apresentem. Mudaremos a lente que os vê, simplesmente.
Dias perfeitos: nós os faremos.
 Redação do Momento Espírita, com base em trecho da
crônica Dias perfeitos, de Cecília Meirelles

Doe Sangue

Doe Sangue